segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Síndrome de Alienação Parental

Seminário “(Com)textos da Criança”

no âmbito da comemoração do 13º Aniversário do Ano Internacional da Família

Divisão de Acção Social e Família, Câmara Municipal de Loulé

Ed. Eng. Duarte Pacheco, Loulé, 23 de Novembro de 2007

Síndrome de Alienação Parental

João Mouta

Os que se dedicam ao estudo dos conflitos familiares e da violência no âmbito das relações interpessoais já se depararam com um fenómeno que não é novo e que até é identificado por mais de um nome.

Alguns chamam-lhe “Síndrome de Alienação Parental”, outros de “implantação de falsas memórias”, lavagem cerebral, destruição da personalidade[1]; há quem a relacione com o exercício de uma parentalidade hostil agressiva[2]; quase todos a caracterizam como uma agressão relacional, com alguma similitude ao chamado Complexo de Medeia[3], com uma tipologia, de certa forma, similar à Síndrome de Munchausen[4]. Há quem afirme que a criança desenvolve um estado psicológico similar ao da Síndrome de Estocolmo[5]. Existem também referências de que as crianças que padecem de formas profundas da Síndrome da Alienação Parental sofrem efeitos similares aos que são estudados pela Psicologia da Tortura. Todos concordam que estamos perante uma vitimização e um abuso da Criança.

Este é um tema que desperta cada vez mais a atenção porque a sua prática tem vindo a ser denunciada de forma recorrente.

A alteração do papel da mulher na sociedade e do homem na família, a perspectiva que a sociedade adquiriu sobre os Direitos da Criança, plasmados, por exemplo, na Convenção de Nova Iorque sobre os Direitos da Criança e na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia[6], a profunda mudança no conceito de família e o primado da afectividade na identificação das estruturas familiares conduzem-nos à valoração do que se chama filiação afectiva.

As construções sociais de família e de criança são ideais relativamente recentes.

A criança, no seio da realidade social presente, é sujeito de direitos próprios e é olhada e sentida como fruto do amor dos pais e, por isso, merecedora de protecção e carinho.

O Direito de Família por via do tratamento interdisciplinar que vem recebendo, passou a dedicar maior atenção às questões de ordem psíquica, permitindo o reconhecimento da presença de dano afectivo pela ausência de convívio paterno-filial, e o estabelecimento do perigo psíquico, emocional e afectivo para a Criança ou Jovem.

Síndromeconjunto bem determinado de sinais e sintomas que ocorrem em conjunto e que podem traduzir uma modalidade patogénica;

Alienaçãoperturbação mental permanente ou passageira, na qual se regista uma anulação da personalidade individual;

A Síndrome da Alienação Parental, é uma patologia caracterizada pela rejeição do progenitor ‘não guardião’ provocada, quase sempre, pelo outro progenitor (aquele que detém a exclusividade da guarda sobre os filhos); diz respeito às sequelas emocionais e comportamentais de que vem a padecer a criança vítima do afastamento do filho de um dos progenitores (centra-se no comportamento da criança e na injustificada campanha negativa sobre o outro progenitor junto da criança).

Richard Gardner criou em 1985 o termo Parental Alienation Syndrome que usou para descrever um distúrbio que surge primariamente no contexto das disputas pelo exercício do poder paternal, e a sua primeira manifestação é a campanha junto da criança para denegrir o outro progenitor.

De acordo com Gardner a Síndrome da Alienação Parental é composta por dois factores: 1) a programação (lavagem cerebral) da Criança por um dos progenitores com o objectivo de denegrir o outro, e 2) contribuições da própria criança em apoio do progenitor alienante na campanha contra o progenitor alienado.

Alienação Parental é o processo que consiste em, sem razão válida, programar uma criança para que odeie um ou ambos os seus progenitores; é o afastamento do filho de um dos progenitores, provocado pelo outro (centra-se no comportamento do progenitor). Alienação Parental é a criação de uma relação de carácter exclusivo entre a criança e um dos progenitores, com o objectivo de banir o outro.

A rotura da vida familiar e, em particular, os momentos pré- e pós-divórcio afectam sobremaneira as crianças.

É nestes momentos da vida familiar que as crianças se encontram mais vulneráveis aos abusos e à violência. Resultam do processo de rotura da vida familiar dos progenitores atribulações afectivas, violência emocional, ausência de cuidados básicos e ausência de guarda, potenciadas pela falta de preparação para a parentalidade e pela impossibilidade de vigilância e controlo do exercício do poder paternal. Porque a parentalidade é uma árdua tarefa.

A parentalidade é porventura a tarefa mais desafiante da vida adulta e os pais constituem uma das influências mais cruciais das vidas dos filhos sendo que os seus componentes, como sejam, os comportamentos, as cognições e os afectos filiais, estão intrinsecamente ligados entre si.

É para protecção dos filhos que não obstante se dissolver o casal conjugal há que manter o casal parental.

A alienação parental é obtida por meio de um trabalho contínuo realizado, por vezes, de modo silencioso ou não explícito. Os investigadores constatam que o progenitor alienante utiliza tanto meios explícitos como contidos, tais como a lavagem cerebral ou a indução, mentir acerca do pai, ou estabelecendo um subtil pacto de abandono se a criança não se aliar a ela.

Mas, a alienação nem sempre é alcançada por meio de lavagens cerebrais ou discursos atentatórios. Na maior parte dos casos, o cônjuge titular da guarda, diante da injustificada resistência do filho em ir ao encontro do outro progenitor, limita-se a não interferir.

É curioso observar que, em situações como essas, a criança quando questionada acerca dos motivos pelos quais não deseja estar com o outro progenitor não fornece qualquer explicação convincente. Algumas vezes a justificativa resume-se ao desagrado de comparecer a determinados lugares (casa dos avós, por exemplo); em outras oportunidades, a justificativa encontra amparo na não-participação do progenitor em determinadas brincadeiras, ou mesmo no inconformismo com o cumprimento dos deveres escolares ou de banais regras de comportamento imposto pelo outro progenitor.

Em outras circunstâncias, o progenitor alienante opõe às visitas toda sorte de desculpas: estar a criança febril; acometida por dor de garganta; visitas inesperadas de familiares; festinhas na casa de amigos, etc.. Também com frequência, o progenitor alienante vale-se de chantagem emocional para lograr a alienação parental: induz a criança à crença de que, se ela mantiver relacionamento com o outro progenitor, o está traindo, ao permitir que ele, progenitor alienante, permaneça só, abandonado e, portanto, infeliz.

Surge, assim, um discurso condicionado por conflitos complexos de lealdade; um discurso coincidente com o do progenitor alienante, a quem naturalmente amam, de quem dependem, e a quem, por isso, dedicam, também, um complexo sentimento de profunda lealdade.

É preciso ter presente que esta também é uma forma de abuso que põe em risco a saúde emocional de uma criança. Ela acaba passando por uma crise de lealdade, pois a lealdade para com um dos pais implica deslealdade para com o outro, o que pode vir a gerar um sentimento de culpa quando, na fase adulta, constatar que foi cúmplice de uma grande injustiça.

As crianças de pais divorciados, na sua grande maioria, “continuam a aderir aos conflitos e às identificações mórbidas do progenitor mais fraco. Prisioneiras em situações de dupla aliança, simultaneamente actores e espectadores, elas não conseguem exprimir o seu verdadeiro desejo …[7].

Marcel Rufo, vai até um pouco mais longe nesta sua apreciação, quando diz: “É isso, aliás, o que nos ensina o conto da Branca de Neve: a rapariga sabe muito bem que não deveria dar uma dentada na maçã oferecida pela feiticeira; não consegue, no entanto, impedir-se de o fazer, muito simplesmente porque sofre tanto por não ter mãe que prefere envenenar-se com aquela maldita maça, que pelo menos a faz acreditar que alguém se interessa um pouco por ela.

Se todas as crianças do mundo se identificam com a Branca de Neve é, justamente, por estarem convencidas de que mais vale ter uma madrasta feiticeira do que mãe nenhuma. Por outras palavras, o medo do abandono é mil vezes mais forte que o medo da monstruosidade.[8]

O detentor da guarda, ao destruir a relação do filho com o outro, assume o controle total.

Tornam-se unos, inseparáveis. O outro pai passa a ser considerado um invasor, um intruso a ser afastado a qualquer preço.

Neste jogo de manipulações, todas as armas são utilizadas, inclusive a assertiva de a criança ter sido vítima de abuso sexual.

A narrativa de um episódio durante o período de visitas que possa configurar indícios de tentativa de aproximação incestuosa é o que basta. Extrai-se deste facto, verdadeiro ou não, denúncia de incesto. O filho é convencido da existência de um facto e levado a repetir o que lhe é afirmado como tendo realmente acontecido.

Nem sempre a criança consegue discernir que está sendo manipulada e acaba acreditando naquilo que lhe é dito de forma insistente e repetida. Com o tempo, nem o progenitor alienante consegue distinguir a diferença entre verdade e mentira. A sua verdade passa a ser verdade para o filho, que vive com falsas personagens de uma falsa existência, implantando-se, assim, falsas memórias.

Como é sabido, as acusações de abuso sexual são frequentes nos Processos de Regulação do Exercício do Poder Paternal, utilizadas para justificar comportamentos alienadores dos menores, lançando o anátema sobre o progenitor não guardião, e criando dificuldades ao Julgador na sua já difícil tomada de decisão sobre como garantir o superior interesse da Criança.

Na sua quase esmagadora maioria, essas acusações não correspondem a factos reais. Pelo que, ainda que a criança relate acontecimentos desta natureza, e como bem diz Marcel Rufo, quando se refere a crianças vitimas de abuso sexual, “é preciso estar muito atento ao que diz a criança, sem que isso signifique que se deva acreditar nela cegamente.[9]

Muitas vezes o afastamento da criança vem ditado pelo inconformismo do cônjuge com a separação; em outras situações, funda-se na insatisfação do progenitor alienante, ora com as condições económicas decorrentes do fim do vínculo conjugal, ora com as razões que conduziram ao rompimento do matrimónio, principalmente quando este se dá por quebra do dever de fidelidade – nada mais do que o resultado de um sentimento de retaliação por parte do ex-cônjuge abandonado, que vê na criança o instrumento perfeito da mais acabada vingança.

Outra hipótese, aliás, cada vez mais frequente, a alienação promovida é o resultado do desejo de posse exclusiva que o progenitor alienante pretende ter sobre os filhos.

Em determinadas situações, a alienação representa mera consequência do desejo de o alienante deter, apenas para si, o amor do filho, algumas outras vezes resulta do ódio que o progenitor alienante nutre pelo alienado, ou mesmo do simples facto de o alienante julgar o outro progenitor indigno do amor da criança.

Os progenitores alienantes afirmam que amam muito os seus filhos, mas, na verdade, sobrepõem os seus sentimentos egoísticos ao superior interesse dos seus filhos. Porque a Criança ama naturalmente os seus dois pais e deve ser livre para livremente os amar.

Por vezes, a resistência e a perseverança do progenitor alienado é tal que consegue ver e estar com os filhos, ou em casas de parentes, ou no infantário, colégio ou escola ou até mesmo em casas públicas de encontro familiar, e a alienação não é atingida em termos absolutos. Mas noutras vezes, o trabalho incansável de destruição da figura do progenitor alienado, promovida pelo progenitor alienante, conduz a situações extremas de alienação, que acabam por inviabilizar qualquer contacto com o progenitor definitivamente alienado.

Outro meio de manobra para excluir o outro progenitor da vida do filho é a mudança de cidade, região ou país. Geralmente essa transferência de domicílio dá-se de modo abrupto, após anos de vida em local ao qual não apenas o progenitor alienante se encontrava acostumado e adaptado, como também a criança que, de repente, se vê privada do contacto com o progenitor alienado, com os familiares, com os amiguinhos, com a escola a que já se encontrava integrada, etc.

E tudo em nome de vagas desculpas: melhores condições de trabalho ou de vida, novo relacionamento amoroso com pessoa residente em cidade diferente e, quase sempre, distante, etc.

Nesses casos, adverte Gardner, o juiz deve se mostrar muito atento, para verificar quando se trata de mudança ditada por motivos reais e justificados ou quando ela não passa de subterfúgio para afastar o outro progenitor do filho.

Neste processo alienante, a criança aprende que comportamentos hostis e abusadores são aceitáveis nas relações e que a decepção e a manipulação são práticas normais numa relação.

Os efeitos da síndrome são similares aos de perdas importantes – morte de pais, familiares próximos, amigos, etc. A criança que padece da síndrome da alienação parental passa a revelar sintomas diversos: ora apresenta-se como portadora de doenças psicossomáticas, ora se mostra ansiosa, deprimida, nervosa e, principalmente, agressiva. Os relatos acerca das consequências da síndrome da alienação parental abrangem ainda depressão crónica, transtornos de identidade, comportamento hostil, desorganização mental e, às vezes, suicídio.

Por essas razões, instilar a alienação parental na criança é considerado como comportamento abusivo com gravidade igual á dos abusos de natureza sexual ou física.

Logo que se confirma estar em curso um processo de alienação parental, é imprescindível que a Justiça impeça o seu desenvolvimento, impedindo, dessa forma, que a síndrome se venha a instalar.

É imperioso que os juízes estejam cientes dos elementos e dos comportamentos identificadores da alienação parental para que, na presença destes, adopte, com carácter de urgência, as medidas adequadas.

Todos nós, enquanto sociedade, cada um de nós no desempenho das suas funções próprias, tem de impedir a instalação da alienação parental em cada Criança. A nossa preocupação e trabalho tem que ser no desenvolvimento das competências parentais que conduzam ao exercício duma Parentalidade Positiva, que, afinal, mais não é do que o comportamento parental fundado no respeito pelos direitos da criança que visa assegurar a satisfação das necessidades básicas através da protecção dos riscos e a criação de um ambiente que promova o seu desenvolvimento harmonioso, valorize a sua individualidade (e especificidade) e autonomia.

Não podemos pactuar com os comportamentos que conduzem e indiciam a presença da Alienação Parental, como sejam:

Recusar passar as chamadas telefónicas do outro progenitor aos filhos;

Organizar várias actividades com os filhos durante o período que o outro progenitor deve normalmente exercer o direito de visitas;

Apresentar o novo cônjuge aos filhos como a nova mãe ou o novo pai;

Interceptar as cartas e os pacotes mandados aos filhos pelo outro progenitor;

Desvalorizar, denegrir e até mesmo insultar o outro progenitor na presença dos filhos;

Recusar informações ao outro progenitor sobre as actividades em que os filhos estão envolvidos (desportos, actividades escolares, grupos teatrais, escotismo, etc.);

Falar de maneira descortês do novo cônjuge do outro progenitor;

Impedir o outro progenitor de exercer seu direito de visita;

“Esquecer” de avisar o outro progenitor de compromissos importantes (festas escolares, dentistas, médicos, psicólogos);

Envolver pessoas próximas (sua mãe, seu novo conjuge, etc.) na lavagem cerebral de seus filhos;

Impedir o outro progenitor de ter acesso às informações escolares e/ou médicas dos filhos;

Ir de férias sem os filhos e deixá-los com outras pessoas que não o outro progenitor, ainda que este esteja disponível e queira ocupar-se dos filhos;

Proibir os filhos de usarem a roupa que o outro progenitor comprou;

Ameaçar punir os filhos se eles telefonarem, escreverem, ou se comunicarem com o outro progenitor de qualquer maneira;

Culpar o outro progenitor pelo mau comportamento dos filhos

Os pais têm que tomar consciência que o poder paternal é exercido para a satisfação do superior interesse da criança.

"Já é hora de ser respeitado o direito que os filhos possuem de desfrutar de um espaço psico-físico com cada um dos pais. ... Aqueles que a isso se negam ferem a ética das relações de família e fazem por desmerecer os filhos que têm."

“Mãe é Mãe”

Ana Sá Lopes - Jornalista ( ana.s.lopes@dn.pt )

Há quanto tempo é que o teu pai não telefona? Vais telefonar-lhe para quê? Ele é que tem a obrigação.

Gostava de o ver aqui, a tratar das roupas e da escola e das doenças. Não faz a mínima ideia, nem quer saber. Lembras-te como foi péssimo o último fim-de-semana que passaste lá em casa. Aquilo está tudo cheio de pó, não é? E não comem a horas, pois não?

Não me admira, com aquela fulana. A madrasta da Gata Borralheira é capaz de ser melhor. Qualquer dia obriga-te a lavar a loiça.Ele sempre foi insuportável. Aliás, todos os homens (ou quase) são intratáveis. Umas bestas (quase).
A maior parte faz os filhos e depois não quer saber. São todos iguais, mais ou menos.E este ano as férias voltam a ser uma seca, não é? Não percebo, como é que ele não te leva a Nova Iorque ou à Tailândia ou ao México ou ao Havai. Sempre aquelas férias pindéricas na praia. Julga que isso é uma grande coisa? Farta de praia estás tu.Eu sei perfeitamente o que é para ti aturares aquilo tudo. Da última vez doeu-te a cabeça e só pode ter sido disso. E depois a fulana não joga com o baralho todo. E o vestido que te deu? Alguma vez tu podias ir para algum lado assim vestida? Não faz ideia, deve ser assim na terra dela.Se ele te telefonar, diz-lhe que este fim-de-semana já está tudo combinado para irmos para Setúbal. E no outro tens dois aniversários, o da tia Zinha e o da prima Vera. Só se for no outro e mesmo assim convinha que fosse depois do almoço de sábado e se ainda pudesses vir cá dormir porque no dia seguinte há reunião dos escuteiros muito cedo. Escusavas de dormir fora.

Aliás, toda a gente sabe que andar de um lado para o outro faz mal às crianças. Retira-lhes a estabilidade emocional. As crianças precisam de uma casa, de identificar o seu próprio espaço físico, não podem andar como se fossem trouxas. Ou sem-abrigo. Mas deve ser mesmo isso que ele quer.

Já não me pode chatear a mim, agora chateia-te a ti. Deve ser de propósito. Sabe que tu não tens pachorra e telefona-te a obrigar. Eu também não gostava. Imagino o inferno. Coitada de ti!

Por mim tu vais para casa dele sempre que quiseres e quando quiseres.
Até podes mesmo ficar lá a morar de vez. Ficavas logo a saber o que era bom. Acabavam-se as fitas, a papinha feita.

Mas isso não deixo, porque ele é capaz até de passar a noite a embebedar-se nos bares com as crianças sozinhas em casa. Lá no frigorífico nunca deve haver leite, o pão é capaz de ser comprado uma vez por semana. Ou é bimbo. Estás-te a ver a comer pão bimbo todos os dias? Só sei é que se ele estivesse muito preocupado contigo telefonava mais vezes. Há quanto tempo não o vês? Toda a gente acha isso inacreditável. Eu qualquer dia tenho uma conversa com ele. Mas isso também não serve para nada.

Se calhar o que ainda era melhor era levar-te a um pedopsiquiatra.

"As Crianças começam sempre por amar os seus Pais;

Crescidas, julgam-nos;

Por vezes, perdoam-lhes."

Oscar Wilde



[1] Destruição da personalidade é a tentativa intencional de influenciar a imagem ou a reputação de uma pessoa em concreto para que outros desenvolvam sobre ela uma percepção negativa. Envolve exagero deliberado e/ou manipulação dos factos de forma a dar uma falsa imagem da pessoa.

[2] Parentalidade Hostil Agressiva define-se como um padrão de comportamento, manipulação, acções e decisões de um indivíduo (habitualmente um dos progenitores ou o guardião) que, quer directa ou indirectamente, cria desnecessárias dificuldades ou interferências na relação da criança com outra pessoa envolvida na criação e educação e/ou promove ou mantém um carácter não garantido e desigual na estabelecimento dos encontros entre a criança e os pais e, ainda, promove conflitos desnecessários com o progenitor e ou guardião o que afecta duma forma adversa o exercício da parentalidade e o desenvolvimento da criança, sendo frequentemente usada como ferramenta para levar a criança a alinhar com um dos progenitores durante o litígio pela custódia ou pelo controlo efectivo da criança.

Parentalidade Hostil Agressiva é considerada pelos técnicos das áreas legal e de saúde como sendo doentio, anti-social, comportamento abusivo que traumatiza emocionalmente, sendo um exercício disfuncional da parentalidade e, por isso, contrário ao interesse da criança.

[3] O Complexo de Medeia é usado, por vezes, para descrever os progenitores que fazem mal aos seus próprios filhos. Medeia, uma história de profundo amor que se transformou em ódio intenso, por Eirípides cerca de 400 aC. Medeia, uma das mais poderosas mulheres da mitologia grega, filha do rei da Cólquida, surge inicialmente como heroína movida pelo amor, ajudando Jasão, líder dos argonautas, a se apoderar do famoso velo de ouro. Mas mesmo como aliada do herói, os métodos por ela usados deveriam ter sido suficientes para levantar algumas suspeitas.

Para retardar os seus perseguidores, chefiados pelo pai, Medeia vai cortando pedaços do próprio irmão e atirando-os ao mar. Ao chegarem em Iolcos, Medeia salva Jasão, agora matando o tio do herói, que tentava roubar o velo de ouro. O casal apaixonado tem que fugir então para Corinto.

Jasão, subestimando a fúria de Medeia, resolve abandoná-la para casar com Glauce, filha do rei de Corinto. A vingança terrível começa pela rival. Medeia envia-lhe um vestido envenenado, que acaba por causar a morte dela e do pai. Não satisfeita, assassina também os próprios filhos, como forma de punir Jasão. Ela destrói aquilo que a intimidade entre ambos produziu. O seu ódio vai para além das suas necessidades instintivas de proteger a sua própria prole; Medeia tem de fazer com que Jasão sofra mais. Jasão diz-lhe “Tu amava-los, e mataste-os,” ao que ela responde “Para te fazer sentir dor”.

Wallerstein e Kelly descreveram nos anos 70 do século passado um Complexo de Medeia com uma dinâmica similar à Síndrome de Alienação Parental.

A maioria das mulheres – porque há raras e honrosas excepções para confirmar a regra – tenham ou não desejado a separação, assim que esta acontece, iniciam um processo de destruição do ex-parceiro/marido/pai de seus filhos. Passam, assim, a sofrer de uma espécie de complexo de Medeia. Para que sofram os pais, passam a "matar" (emocional e psicologicamente) seus filhos. Dificultam o relacionamento entre pai e filhos, interferem, mentem, escondem, manipulam até à exaustão as mentes e emoções dos filhos e ainda se fazem de vítimas. O facto de que tais atitudes interferem negativamente no desenvolvimento da criança não parece fazer parte das preocupações das Medeias modernas. Uma mãe que põe as suas crianças contra o pai delas, provavelmente, terá, pelo menos, comportamentos paranóicos duma estrutura de personalidade psicótica ou borderline. Ela não consegue lidar com a perda, e permanece ligada ao seu (ex)marido num íntimo sentimento de ódio e mantém as crianças amarradas por um profundo sentimento de lealdade para com ela.

[4] A síndrome de Munchausen é uma doença psiquiátrica em que o paciente, de forma compulsiva, deliberada e contínua, causa, provoca ou simula sintomas de doenças, sem que haja uma vantagem óbvia para tal atitude que não seja a de obter cuidados médicos e de enfermagem.

A síndrome de Munchausen "by proxi" (por procuração) ocorre quando um parente, quase sempre a mãe (85 a 95%), de forma persistentemente ou intermitentemente produz (fabrica, simula, inventa), de forma intencional, sintomas em seu filho, fazendo que este seja considerado doente, ou provocando ativamente a doença, colocando-a em risco e numa situação que requeira investigação e tratamento.

Às vezes existe por parte da mãe o objectivo de obter alguma vantagem para ela, por exemplo, conseguir atenção do marido para ela e a criança ou se afastar de uma casa conturbada pela violência. Nas formas clássicas, entretanto, a atitude de simular/produzir a doença não tem nenhum objetivo lógico, parecendo ser uma necessidade intrínseca ou compulsiva de assumir o papel de doente (no by self) ou da pessoa que cuida de um doente (by proxy). O comportamento é considerado como compulsivos, no sentido de que a pessoa é incapaz de abster-se desse comportamento mesmo quando conhecedora ou advertida de seus riscos. Apesar de compulsivos os actos são voluntários, conscientes, intencionais e premeditados. O comportamento que é voluntário seria utilizado para se conseguir um objectivo que é involuntário e compulsivo. A doença é considerada uma grave perturbação da personalidade, de tratamento difícil e prognóstico reservado. Estes actos são descritos nos tratados de psiquiatria como distúrbios factícios.
A síndrome de Munchausen por procuração é uma forma de abuso infantil. Além da forma clássica em que uma ou mais doenças são simuladas, existem duas outras formas de Munchausen: as formas toxicológicas e as por asfixia em que o filho é repetidamente intoxicado com alguma substância (medicamentos, plantas etc.) ou asfixiado até quase a morte.

Frequentemente, quando o caso é diagnosticado ou suspeitado, descobre-se que havia uma história com anos de evolução e os eventos, apesar de grosseiros, não foram considerados quanto a possibilidade de abuso infantil. Quando existem outros filhos, em 42% dos casos um outro filho também já sofreu o abuso. É importante não confundir simulação (como a doença simulada para se obter afastamento do trabalho, aposentar-se por invalidez, receber um seguro ou não se engajar no serviço militar). Alguns adolescentes apresentam quadro de Munchausen by self muito similares aos apresentados por adultos.

A doença pode ser considerada uma forma de abuso infantil e pode haver sobreposição com outras formas de abuso infantil. À medida que a criança se torna maior há uma tendência de que ela passe a participar da fraude e a partir da adolescência se tornarem portadores da síndrome de Munchausen clássica típica em que os sintomas são inventados, simulados ou produzidos nela mesma. Ao contrário do abuso e violência clássica contra crianças as mães portadoras da síndrome de Munchausen by proxy não são violentas nem negligentes com os filhos.

O problema, descrito a primeira vez por Meadow em 1977, é pouco conhecido pelos médicos e sua abordagem é complexa e deve envolver o médico e enfermagem, especialistas na doença simulada, psiquiatras/psicólogos, assistentes sociais e, mais tarde, advogado e director clínico do hospital e profissionais de protecção da criança agredida.

[5] A Síndrome de Estocolmo é um estado psicológico particular desenvolvido por pessoas que são vítimas de sequestro. A síndrome se desenvolve a partir de tentativas da vítima de se identificar com seu captor ou de conquistar a simpatia do sequestrador.

A síndrome recebe seu nome em referência ao famoso assalto de Norrmalmstorg do Kreditbanken em Norrmalmstorg, Estocolmo que durou de 23 de Agosto a 28 de Agosto de 1973. Nesse acontecimento, as vítimas continuavam a defender seus captores mesmo depois dos seis dias de prisão física terem terminado e mostraram um comportamento reticente nos processos judiciais que se seguiram. Duas das vítimas se casaram com os sequestradores após o término do processo. O termo foi cunhado pelo criminólogo e psicólogo Nils Bejerot, que ajudou a polícia durante o assalto, e se referiu à síndrome durante uma reportagem. Ele foi então adoptado por muitos psicólogos no mundo todo.
É importante observar que o processo da síndrome ocorre sem que a vítima tenha consciência disso. A mente fabrica uma estratégia ilusória para proteger a psique da vítima. A identificação afectiva e emocional com o sequestrador acontece para proporcionar afastamento emocional da realidade perigosa e violenta à qual à pessoa está sendo submetida.

[6] Artigo 24.º * Direitos das crianças

1. As crianças têm direito à protecção e aos cuidados necessários ao seu bem-estar. Podem exprimir livremente a sua opinião, que será tomada em consideração nos assuntos que lhes digam respeito, em função da sua idade e maturidade.

2. Todos os actos relativos às crianças, quer praticados por entidades públicas, quer por instituições privadas, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança.

3. Todas as crianças têm o direito de manter regularmente relações pessoais e contactos directos com ambos os progenitores, excepto se isso for contrário aos seus interesses.

CARTA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA UNIÃO EUROPEIA * (2000/C 364/01) * PT 18.12.2000 Jornal Oficial das Comunidades Europeias C 364/1.

Este artigo baseia-se na Convenção de Nova Iorque sobre os Direitos da Criança, assinada em 20 de Novembro de 1989 e ratificada por todos os Estados-Membros da União Europeia, nomeadamente nos seus artigos 3º, 9º, 12º e 13º.

[7] Marcel Rufo, Édipo és Tu – Experiências Pedopsiquiátricas, Pergaminho, 2001, p. 75

[8] Marcel Rufo, obra citada, pp. 91 e 92

[9] Marcel Rufo, obra citada, p. 81


BIBLIOGRAFIA

- Aguilar, J. M., S.A.P., Síndrome de Alienación Parental, Ed. Almuzara. Córdoba, 2004.

- Aguilar, J. M., Con mamá y con papá, Ed. Almuzara. Córdoba, 2006.

- Almeida, Ana N., André, Isabel M., e Almeida, Helena N., Famílias e Maus Tratos às Crianças em Portugal – Relatório Final, Assembleia da República, Lisboa, 2001.

- Baker, Amy J. L., Adult Children of Parental Alienation Syndrome: Breaking the Ties That Bind (Norton Professional Book), Maio 2007.

- Branco, Maria Eugénia Carvalho, Vida, Pensamento e Obra de João dos Santos, Livros Horizonte, Março 2000.

- Cartujo, Ignacio B., Estudio descriptivo de Síndrome de Alienacíon Parental en Procesos de Separación y Divorcio. Diseño y Aplicación de un Programa Piloto de Mediación Familiar, Tese de Doutoramento, Departamento de Psicología da Educação da Faculdade de Psicología da Universidade Autónoma de Barcelona, Barcelona 2000.

- Eurípides, Medeia, Introdução, Versão do Grego e Notas de Maria Helena da Rocha Pereira, Coimbra, INIC / Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra, 1991

- Family Conflict Resolution Services, Risk assessment protocol to evaluate the risk of harm to children caused by Hostile-Aggressive Parenting (HAP) (including recommended intervention strategies), Box 61027 Maple Grove P.O., Oakville, Ontario Canada L6J 7P5, Julho 2005 (Website: http://familyconflict.freeyellow.com).

- Feldman, Marc D., Playing Sick?: Untangling the Web of Munchausen Syndrome, Munchausen by Proxy, Malingering, and Factitious Disorder, 2004.

- Ferreira, Teresa, Em Defesa da Criança – Teoria e Prática Psicanalítica da Infância, Assírio & Alvim, 2002.

- Gardner, Richard A., Sauber, Richard S., Lorandos, Demosthenes, The International Handbook of Parental Alienation Syndrome: Conceptual, Clinical and Legal Considerations, The Haworth Press Inc., 2006.

- Gardner, Richard A., Recommendations for Dealing with Parents who Induce a Parental Alienation Syndrome in their Children, Journal of Divorce & Remarriage, Volume 28(3/4), 1998, pp. 1-21.

- Gordon, R. M., The Medea Complex and the Parental Alienation Syndrome: When Mothers Damage Their Daughter’s Ability to Love a Man, Editado por Gerd H. Fenchel, Jason Aronson Inc., Northvale, New Jersey, 1998.

- Lampel, Anita K., Children’s Alignment with Parents in Highly Conflicted Custody Cases, in Family and Conciliation Courts Review, Vol. 34, N.º 2, Abril 1996, pp. 229-239.

- Lowenstein, L.F., Parental Alienation: How to Understand and Address Parental Alienation Resulting from Acrimonious Divorce or Separation, Russell House Publishing, Fevereiro 2007.

- Poliacoff, Jerome H., Parental alienation Syndrome: Testing Gardner’s Theory in the Family Courts, Commentator, vol. 9, pp., 2000.

- Ribeiro, Maria Saldanha Pinto, As Crianças e o Divórcio – O Diário de Ana – Uma História para os Pais, Editorial Presença, Lisboa, 2007

- Rufo, Marcel, Édipo és Tu – Experiências Pedopsiquiátricas, Pergaminho, 1.ª Edição, 2002.

- Silva, Evandro L., e Resende, Mário, SAP: A Exclusão de Um Terceiro, in Síndrome da Alienação Parental e A Tirania do Guardião: Aspectos Psicológicos, Sociais e Jurídicos / organizado pela Associação de Pais e Mães Separados, Editora Equilíbrio Ltda, Porto Alegre, Brasil, 2007.


- Smith, Ronald M., e Smith, Ariel D., Cheated: (The Story of a Father Who Would Not Give Up His Children) A Documented Account of Parental Alienation Syndrome (PAS), Maio 2007.

- Turkat, Ira D., Parental Alienation Syndrome: A Review of Critical Issues, Journal of the American Academy of Matrimonial Lawyers, Vol. 18, 2002, pp.131 a 176.

- Waldron, Kenneth H., e Joanis, David E., Understanding and Collaboratively Treating Parental Alienation Syndrome, American Journal of Family Law, Volume 10, 1996, pp. 121-133.

- Warshak, Richard A., Divorce Poison: Protecting the Parent-Child Bond from a Vindictive Ex, Regan Books, 2003.

- Zander, Joep, Mother-Child-Father; A Trilogy on Parental Alienation, Rela Publishing, Holanda, 2004.

______________________

- Conselho da Europa, Convenção Europeia sobre o Exercício do Direito das Crianças (STCE n.º 160), Estrasburgo, 25.1.1996.

- Conselho da Europa, Convenção Relativa às Relações Pessoais no que se Refere às Crianças (STCE n.º 192), Estrasburgo, 15.5.2003.

- Conselho da Europa, Recomendação Rec(2006)19 do Conselho de Ministros aos Estados membros sobre a politica de apoio a uma Parentalidade Positiva, Estrasburgo, 13.12.2006.

- Comissão das Comunidades Europeias, Comunicação COM(2006) 367 final “Rumo a uma Estratégia da EU sobre os Direitos da Criança”, Bruxelas, 4.7.2006.

- Comité de Peritos sobre as Crianças e as Famílias do Conselho da Europa, Parenting in Contemporary Europe: A Positive Approach, Conferência dos Ministros Europeus responsáveis pelos Assuntos da Família subordinada ao tema “Changes in Parenting: Children Today, Parents Tomorrow”, XXVIII Sessão, 16 e 17 de Maio de 2006, Lisboa.

- Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, Caso Elsholz contra a Alemanha, Processo n.º 25735/94, Estrasburgo, 13 de Julho de 2000.

- União Europeia, Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (2000/C 364/01), Jornal Oficial das Comunidades Europeias C 364/1, 18.12.2000.

Sem comentários: